segunda-feira, 11 de outubro de 2004

Das cidades

Belo Horizonte - A capital de Minas é como o Japão. Consegue preservar tradições em meio ao caos metropolitano. Belo Horizonte seria uma cidade de direita, como a convergência das ruas indica? A programação cultural atende à maioria dos gostos. Na Feira Hippie, aos domingos, uma infinidade de artistas, artesãos, fabricantes de jóias e roupas fecha uma das principais avenidas para comercializar sua produção a preços lúcidos. Nos parques, obras de Nienmeyer e Portinari convivem ao lado de pescadores urbanos da Lagoa da Pampulha. Nas lan-houses e boates, a tecnologia é de última geração. Só falta wi-fi. Apesar de ter rodado algumas horas pelo centro, shoppings e regiões menos óbvias, não encontrei redes wireless para exercitar o warchalking. A caçada continua. Aceito sugestões.

domingo, 10 de outubro de 2004

88 loucos ou Kill Bill 2

Belo Horizonte - Algaravia audiovisual egoísta e provocativa, uma insanidade de humor esquisito. Como se Kubrick, Lynch e Peckimpah tomassem chá na casa do lago em As Invasões Bárbaras. Tudo em Tarantino é uma grande aposta de pós-cinema.

terça-feira, 5 de outubro de 2004

Decoração

Divinópolis - Li no blog do Cláudio Costa que o travesseiro-namorado é o mais novo item da lista de paraísos artificiais que o dinheiro pode comprar. E no André Muggiati sobre a angústia que nos assalta quando percebemos a miséria. E no mesmo post, um comentário do Luís Ene dizia que podemos prescindir de alguns móveis, coincidindo com nossa mudança de São Paulo e os móveis que deixamos com os 10 milhões de vizinhos que nos fazem valorizar mais o espaço. Infelizmente livrar-se dos móveis é como limpar as gavetas: um dia elas terminam cheias novamente.

segunda-feira, 4 de outubro de 2004

As invasões bárbaras

Divinópolis - Centenas de imigrantes africanos foram expulsos ontem, algemados, da Itália. Pela lei, imigrantes pobres devem ser deportados, medida geralmente usada em casos de extradição de criminosos, expulsão de estrangeiros que tenham cometido crime de lesa-pátria ou jornalistas sensacionalistas que desonram presidentes. O governo do PT, que defendia a causa indígena, cede em favor do agribussiness e congela decisão sobre a terra indígena Raposa Serra do Sol. Uma cidade do interior de São Paulo (Porto Ferreira) elegeu o prefeito na cadeia. Ele está preso por pedofilia. O apresentador de TV Gugu Liberato, que levou ao ar reportagem falsa onde jornalistas eram ameaçados de morte, continua na TV. No Rio de Janeiro, a esquerda votou em peso no PFL, para salvar o estado da teocracia pentecostal. Em São Paulo o PT vai unir-se a Paulo Maluf para derrotar o ex-presidente da UNE e ex-exilado da ditadura, José Serra, que é apoiado pelos mais ricos. Repórteres por um dia - não se trata de uma defesa corporativa, mas de uma observação óbvia - fazem o trabalho jornalístico, o direito à informação de qualidade, parecer brincadeira. A blogosfera, antes território das idéias, passou a abrigar a intolerância e a hipocrisia de deformadores de opinião com seus sítios patrocinados. A espiritualidade é confundida com religião, dogmas, intifada. O protestantismo, que surgiu em contraposição ao catolicismo poderoso, avança contra os cultos afro-brasileiros. O Islã, outrora poético, intelectual, caridoso e filosófico sucumbe ao radicalismo selvagem de jovens suicidas e degoladores no Iraque invadido. É a nova revolução cultural, desmontando inteligências e ideologias: miríades de consumidores indômitos em não-lugares enfrentam filas em busca de necessidades artificiais. Desejos e povos estão se misturando por baixo. Uma hibridação que, perdoe-me Canclini, não me trate como um velho e reacionário Aldous Huxley, cheira a degeneração.

sexta-feira, 1 de outubro de 2004

Vote nulo...

Divinópolis - ... se quiser. Ninguém é obrigado a votar em candidatos inúteis, corruptos ou fracos só porque estes se candidataram. O voto nulo protesta contra a falta de opção. Se o número de votos nulos for superior ao de votos válidos, podem ser convocadas novas eleições e candidatos novos podem surgir.

Políticos de baixa qualidade estão no poder, entre outras razões, pela (des)orientação comandada por imprensa e Judiciário, que só concebem o ato de votar em candidatos. Desconsideram o voto que não lhes favorece. O voto útil é disseminado, por ignorância ou por má-fé, como equivalente ao voto em branco. Votar em branco é apoiar o candidato com maior número de votos. É aceitar. É como deixar de votar.

Há 90 municípios no Brasil com candidato único a prefeito. Vi no Jornal Nacional que na última eleição um município votou assim: 45 por cento de votos para o candidato único, 53 por cento de votos em branco e 2 por cento de votos nulos. O TSE decidiu que o candidato único deveria ser eleito porque a maioria de votos em branco só podia significar uma coisa: que o povo queria o candidato único. Um absurdo, considerando que o desejo da população era outro.

Que as urnas eletrônicas sejam dotadas de tecla para anular o voto. Votar nulo é um recado: mostra que a sociedade está descontente com o quadro atual. Que quer novas opções. Vote para prefeito e vereador, se quiser. Mas se seus candidatos não servem, clique num número inexistente e anule seu voto. Votar nulo é um exercício de cidadania. Em branco, de obediência.

quinta-feira, 30 de setembro de 2004

Na Tela

Divinópólis - Bowling for Columbine ou o debate Kerry x Bush? Por um momento, a dúvida. Os dois programas trariam o belicismo à sala de TV. Escolho o debate: a transmissão em inglês é recebida mais rápido que e a traduzida para o espanhol e esta, por sua vez, chegava antes da versão traduzida da Bandnews. Sugestivo.

Kerry é um gentle giant, veterano do Vietnã que gosta de jactar-se quanto à capacidade guerreira e superioridade estratégica. Disse que existe uma maneira certa e uma maneira errada de defender Uncle Sam. Bush estaria insistindo na errada. No contra-ataque, Bush lançava olhares sibilinos e desqualificava o discurso do democrata. Em todas as suas falas (transmitidas para um palmtop no púlpito e um ponto eletrônico produzido com o melhor da nanotecnologia) insistiu que Kerry muda de idéia facilmente, assumindo a máxima de que só os idiotas não mudam de idéia. Como troco, Kerry ironizava a queda nos investimentos na segurança interna e os gastos montruosos nas guerras de expansão no Iraque e no Afeganistão.

Bush irritado, investia no medo, dizendo que o senador é muito indeciso para assumir o comando da nação num momento de crise como o atual. Kerry vingava-se afirmando que a primeira providência na invasão ao Iraque foi proteger os poços de petróleo. Bush retrucava dizendo que prevenir é melhor que remediar. Kerry ironizava dizendo que atacar o Iraque por causa do 11 de Setembro equivale a Roosevelt atacar o México por causa de Pearl Harbor. Bush vacilava entre o texto que aparecia no palm e o que chegava ao seu ouvido e ficou confuso, mas Kerry não percebeu. Kerry demonstrou maior inteligência, o que não é grande coisa diante do fundamentalista texano. O problema é que o povo norte-americano valoriza mais a astúcia que a inteligência. É provável que o selvagem vença o gentle giant. Seja qual for o resultado, o mundo não se tornará mais seguro.

Guerra fria