segunda-feira, 14 de junho de 2004

Do ofício

São Paulo - Custa-me a acreditar que sejamos quem fomos; somos quem somos a cada momento, mas a história de quem fomos tem muitas vezes de ser contada para que possamos verdadeiramente ser quem somos. As pequenas histórias que aqui podem ser lidas contam elas mesmas a história deste sítio, e fazem-no muito melhor do que eu alguma vez poderei, mas existem outras histórias por trás destas que eu mesmo quero contar.

Luís Ene, escritor português em visita ao Brasil, autor dos blogs 1000 e uma e Ene coisas, de quem tomo palavras escritas aqui.

sexta-feira, 11 de junho de 2004

Sobre blogs

São Paulo -
1 - Blogs são coleções de textos preparados por uma ou mais pessoas (podem ser pessoas preparando diferentes textos ou textos a quatro, seis mãos). Blogs são escritos.

2 - Bloggers escrevem blogs. Logo, bloggers são blogueiros e blogs são blogs. Blogs normalmente são diários, mas também podem ser semanários, bissextos, hebdomadários...

3 - Blog não é blig ou blogger. Chamar aos blogs dessa forma equivale a chamar lã aço de Bombril e lâmina de barbear de Gillette. Blogs são blogs. Ponto.

4 - Blogs podem ter ferramentas auxiliares, como os sistemas de comentários, o Blogchalking, o Blogtree e os contadores.

5 - Sistemas de comentários são formas instantâneas de comunicação entre bloggers (ou blogueiros) e seus leitores (que também podem ser blogfans ou blogfreaks). São ferramentas democráticas que os jornais, por exemplo, não têm coragem de instalar.

6 - Blogchalking é um sistema de classificação geográfica criado por um brasileiro, o Daniel Pádua. A idéia é identificar o blogger (blogger é o blogueiro, não o blog) por cidade e até por bairro. Assim pode-se descobrir quem bloga na sua vizinhança. Aquele bonequinho na coluna à esquerda indica que sou um indivíduo do sexo masculino com idade entre 31 e 35 anos (quando comecei estava noutra faixa etária), morador de São Paulo, bairro Butantã, que passa cerca de 40 por cento do seu dia conectado à rede (um exagero, mas os índices disponíveis são 20, 40, 60 e 80 por cento).

7 - Os contadores registram o números de visitas à sua página, mas também registram a origem dos acessos (o país e em alguns casos a cidade), o sistema operacional dos computadores que abrem seu blog mundo afora (já fui lido em 76 países!) e o endereço IP, caso destas e-pístolas.

8 - Blogtree é um serviço criado no MIT (Massachussets Institute of Technology) que estabelece uma espécie de genealogia blogger. Funciona assim: você cria uma conta gratuita, inscreve-se e identifica que blogs influenciaram na criação do seu. Este aqui, por exemplo, foi inspirado no Internetc, no Taperouge e no Metafilter. Da mesma forma, influenciou no surgimento do Canaimé, que por sua vez inspirou o Laranja Podre. Assim, o e-pístolas é tão filho do Metafilter quanto este é bisavô do Laranja Podre.

9 - Ninguém é obrigado a adotar tais ferramentas, mas sabe-se que um blog é mais blog se não está isolado. Um blog só é blog se está numa rede, como seus correspondentes humanos em sociedade.

10 - Blogs podem ser meros depositários de devaneios pessoais sem nenhuma importância para o coletivo humano ou podem contribuir para a discussão de temas socialmente relevantes, como a guerra, a arte ou a arte da guerra.

11 - Nao convém publicar a própria foto num blog. Elas podem ser usadas em montagens obcenas ou ilustrar os posts dos seus inimigos.

12 - Blogs têm um tempo de vida útil. Um dia este blog irá morrer.

quarta-feira, 2 de junho de 2004

Na vitrola
Beto Guedes - Sol de primavera
Flávio Venturini - O andarilho
Lô Borges e Milton Nascimento - Clube da esquina 2

quinta-feira, 27 de maio de 2004

Reflexões numa manhã de quinta-feira
Toda cidade tem uma padaria com o nome da cidade
Toda cidade tem um Hotel Plaza
Toda cidade tem uma Relojoaria Pontual
Toda cidade tem uma Drogaria Avenida
Toda cidade tem um Salão Status
Toda cidade tem uma rua com o nome de outra cidade
Toda cidade tem suscetibilidades

quinta-feira, 20 de maio de 2004

Divinópolis
Pássaros pela manhã. Uma carroça conduzida com tranqüilidade. Sol. Luz de outono. Árvores. Flores amarelas. Uma ponte. Um rio. Montanhas. Um trampo. Um i-Mac. Um bom e velho PC. Um post slow-motion. Uma réstia de sol pela janela. Life is easy.

domingo, 16 de maio de 2004

Na tela
Diários de Motocicleta não apela para "um certo sentimentalismo de esquerda" ao contar a história da viagem de descoberta da América Latina pelo jovem Ernesto Guevara e seu companheiro Alberto Granado. O que este road-movie (ou river-movie) propõe não é panfletário - nem poderia, dada à origem burguesa do diretor Walter Salles -, por isso não deve aumentar significativamente a venda de camisetas com a efígie do revolucionário argentino. Diários de Motocicleta é o resgate do "caminho", que muitos acreditam estar entre a França e a Espanha, ou na trilha inca que conduz a Macchu Picchu. Como diria Carlos Castaneda (ou Belchior) o seu caminho (ou seu lugar) é aquele em que você está. Lembra-nos, entretanto, que a riqueza deste continente está mais nas pessoas que nas incríveis paisagens. A bela fotografia granulada acentua o período histórico e embeleza a tela.

quinta-feira, 6 de maio de 2004

Li Tempos Interessantes, de Eric Hobsbawm
Aqui a leitura do Século 20 por seu maior especialista ocorre de dentro para fora, como se os historiadores,

A história exige mobilidade e capacidade de
avaliar e explorar um vasto território, isto é,
a capacidade de ir além das próprias raízes.
Por isso é que não podemos ser plantas, incapazes
de deixar seu solo e habitat nativo, porque
nosso tema não pode esgotar-se em um único
habitat ou nicho ambiental (p. 451)


esses maravilhosos e poeirentos examinadores tardios das idiossincrasias humanas tivessem o direito de examinar a história por meio de suas experiências pessoais. Bom, Hobsbawm tem.

Os que têm a minha idade em alguns países
do hemisfério norte são a primeira geração de
seres humanos que efetivamente viveram como adultos
antes desse extraordinário lançamento da nave
espacial coletiva da humanidade em órbitas de
inaudita revolução social. (p. 434)


A formação multicultural (nascido em Alexandria, criado em Viena, jovem comunista em Berlim, fugiu para a Inglaterra, acompanhou a guerra fria, pôs o pé na estrada nos anos 60, assistiu à consolidação do imperialismo

O poder não corrompe necessariamente
as pessoas como indivíduos, embora não seja
fácil resistir a sua corrupção. O que o poder faz,
especialmente em tempos de crise e de guerra,
é tornar-nos capazes de realizar e justificar
coisas inaceitáveis se fossem feitas
por indivíduos privados. (p. 150)


e o surgimento da internet...) dá a Eric Hobsbawm essa característica única dos que conviveram (e aprenderam) com diferentes povos e línguas: reconhecer-se mais membro da espécie humana que tão-somente alemão, inglês, judeu etc. Fora o fato de ter acompanhado a época de maiores transformações na história, o sinistro século passado.

Em Tempos interessantes EH trabalha com uma infinidades de autores, escolas e movimentos que exigem dezenas de leituras complementares. Assim, vamos descobrindo um E. P. Thompson aqui,

... que seria registrado pelo Índice de
Citações de Artes e Humanidades (1976-1983)

como um dos cem autores do século 20 mais citados
em quaisquer dos campos cobertos pelo Índice. (p. 240)

um Ephraim Feuerlicht acolá,

Regressou à Áustria como membro
do bureau político do PC austríaco, escreveu
um livro curto e revelador sobre a França
e editou o jornal teórico do partido. (p. 164)

mas com o tempo, a bibliografia torna-se tão numerosa que chega a comprometer a própria conclusão do livro. Sorte têm os que chegam vivos às páginas finais que retratam um período da história mais conhecido, porquanto mais recente.

Para fãs do Século 20.

sexta-feira, 30 de abril de 2004

Na tela (As invasões bárbaras)
A vantagem de assistir a um filme meses depois do seu lançamento é não carregar os críticos para a sala de cinema. Dessa forma, podemos ver esta película sobre a brevidade da vida com o espírito livre dos cadernos de cultura. Assim o merece o bom e velho cinema de autor.

As invasões bárbaras dá seqüência a O declínio do império americano, filme de 1986 cujo título dispensaria comentários se fosse óbvio. Mas não é. E as razões pelas quais não é também não serão ditas. Diga-se apenas que os dois filmes, escritos e dirigidos pelo franco-canadense Dennys Arcand são a (auto)crítica de uma certa, como diria Carlos Saraiva, vã guarda.

Excepcionalmente bem-escritos, os diálogos são a marca das duas obras, que devem ser assistidas preferencialmente em seqüência. A segunda parte apresenta o mesmo grupo de amigos reunidos à margem do lago, desta vez para encarar a doença e morte iminente de um deles.

Discussões de pais e filhos distantes uma geração, distantes alguns livros, distantes uma carteira de capitais, distantes afetivamente em intervalos de sono na narcose dos hospitais, o 11 de setembro na TV e as considerações políticas do ácido grupo de fãs de trufas e vinho - há um trecho formidável, em que Rémy e o filho atravessam a fronteira e são saudados por uma sorridente moça loura, que lhes diz "Welcome to America" e ganha em resposta: "Aleluia", "Amém".

Para professores universitários, famílias em crise e todos aqueles que amam a vita brevis.

sábado, 24 de abril de 2004

Na tela (Kill Bill – Vol. 1)
Para quem conhece Anime, Electra, Mangá, Mortal Kombat, O Tigre e o Dragão, e Western Spaghetti, assistir a Kill Bill (Vol. 1) pode ser uma agradável experiência de transcendência pop. Ou um certificado de vítima da indústria cultural, dependendo do ponto-de-vista. Trata-se um filme conservador no sentido tarantinesco do termo: confirma-o a não-linearidade do roteiro, personagens doentes e a violência explícita.

Mas nada é real em Kill Bill - filme que sabe que é filme -, exceto o sentimento de vingança tão típico do ser humano. E nesse cinema pelo cinema, a ultra-violência comparece como caricatura, afastando-se da proposta de Cães de Aluguel (Michael Madsen tortura um policial) para trilhar caminhos de humor sibilino.

Quentin Tarantino - funcionário de videolocadora e freqüentador de cinemas de segunda categoria que virou cineasta - irrita quem não lhe alcança a fina ironia, mas é muito considerado no grupo dos que assistem 500 filmes por ano, lêem quadrinhos, gostam de filosofia oriental e artes marciais.

O quarto filme de QT traz movimentos de câmera abusados, referências a dezenas de filmes e HQs e uma trilha sonora tão esdrúxula quanto apropriada. E apesar da crítica média, aquela que conta todo o filme, seja por soberba ou limitações técnicas, trata-se de peça cinematográfica de indiscutível qualidade.

PS: Se você não leu Electra por Frank Miller, desconhece Mangá, nunca assistiu Akira, não jogou Mortal Kombat, não viu O tigre e o dragão nem sabe o que é western spaghetti, não se preocupe: Kill Bill tem muita ação.

quarta-feira, 21 de abril de 2004

Sem título
Era uma vez um partido tão democrático que cada membro tinha opinião própria. Jamais chegaram a um acordo.

quinta-feira, 15 de abril de 2004

Sem título
Ele queria escrever. E escreveu. Mas escreveu sobre não ter o que escrever,
como sempre fazem os que escrevem.

quinta-feira, 8 de abril de 2004


Smells like teen spirit
Há 10 anos Kurt Cobain se matava em Seattle, encerrando mais cedo os anos 90. O que viria depois no rock, de Radiohead a Smashing Pumpkins, de Beck Hansen a Belle and Sebastian, de Pizzicato Five a Coldplay, já encerrava um pouco do que ouvimos agora, nos 2000. Estou no time dos que acham que o Nirvana foi a salvação do rock nos anos 90, mas não culpo a geração anterior (Smiths, The Cure, Jesus and Mary Chain, Echo and the Bunnymen, The Cult, U2...) ou a atual (The Hives, The Vines, The Strokes, White Stripes, Kings of Leon) pela ausência de ícones. Talvez Cobain, imolado pelo maisntrean, fãs obtusos, depressão e drogas represente exatamente isso: o fim dos heróicos anti-heróis do rock n' roll.

terça-feira, 6 de abril de 2004

Réquiem
Ao professor Octavio Ianni, que morreu no domingo e reunia agudeza intelectual com afetividade, ativismo com temperança e muito colaborou na conclusão da minha pós-graduação. Suas sugestões ajudaram meu Índio na Rede a encontrar equilíbrio entre a sociedade da informação e o pensamento selvagem.

segunda-feira, 5 de abril de 2004

Cidadania
Para doações em dinheiro às vítimas do Catarina: Banco do Brasil (agência 3226-13 ­ conta-corrente 7.285­0) e BESC-Banco do Estado de Santa Catarina (agência 0680, conta-corrente 802.500-5).

Guerra fria